Após um longo debate em plenário e com maioria de votos (6 a 5) formada pelo recebimento da denúncia contra o senador Valdir Raupp, por crime contra o Sistema Financeiro Nacional, foi adiada a conclusão do julgamento do Inquérito (Inq 2027). Com isso, embora tenha sido formada a maioria pelo recebimento da denúncia do Ministério Público Federal e a abertura de ação penal contra o parlamentar, o julgamento não foi concluído e sem a proclamação qualquer um dos ministros pode alterar seu voto.
Segundo a denúncia do MPF, o desvio teria ocorrido entre 1998 e 1999, quando Raupp era governador de Rondônia com o repasse dos recursos recebidos pelo convênio para uma conta única do Estado de Rondônia. Tais recursos, decorrentes do empréstimo junto à União e ao Banco Mundial (BIRD), seriam destinados ao Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia (Planafloro).
A tipificação do crime apresentado na denúncia consta do artigo 20 da Lei nº 7.492/86, que trata de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, cuja pena prevista é de dois a seis anos de reclusão e multa.
O plenário se dividiu. Uns ministros consideraram que faltavam indícios para o recebimento da denúncia e a tipificação do crime contra o sistema financeiro. Já os outros acreditavam ser incontestável a presença de provas que caracterizariam o envolvimento de Valdir Raupp no suposto desvio de verbas de convênio firmado com o Banco Mundial.
Seis ministros votaram pelo recebimento da denúncia: o relator, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Eros Grau, Carlos Ayres Britto, Marco Aurélio e Celso de Mello. Já os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e Cezar Peluso votaram pela rejeição da denúncia.
Diante do impasse, mesmo com maioria formada, o ministro Ricardo Lewandowski chegou a anunciar que
pediria vista do processo “para examinar melhor esta questão. Eu já votei, mas eu quero realmente me reconvencer e reexaminar esses detalhes todos”. Lewandowski já havia votado pela rejeição da denúncia.
Após a ponderação de alguns colegas que alertaram sobre o perigo de prescrição de um ou outro delito com a demora no julgamento e que qualquer alteração no voto de Lewandowski não mudaria o resultado do julgamento pelo recebimento da denúncia, o ministro desistiu do pedido de vista ao afirmar: “nós aqui temos de agir com a maior transparência. Se algum colega traz alguma suspeição sobre meu pedido de vista, quanto à motivação, eu desisto da vista”. O presidente da Corte, Gilmar Mendes, insistiu que qualquer ministro tem o direito de pedir vista e reexaminar seu voto.
Mas antes que houvesse um pedido de vista, o ministro Joaquim Barbosa (relator), preocupado com a demora na conclusão do julgamento, que poderia acarretar a prescrição dos supostos delitos praticados, pediu o adiamento da conclusão do julgamento. “Eu gostaria de frisar mais uma vez, que eu proferi voto nesse processo há 2 anos e 8 meses, portanto há 2 anos e 8 meses eu não tenho mais o controle dos autos”, disse o relator.
E acrescentou: “nós estamos em uma situação delicada, alguns fatos prescrevem na semana que vem, é por isso que eu estou chamando a atenção para esta delonga. Nós estamos há 3 anos para examinar uma denúncia a meu ver, simples”. “Se há uma resistência em proclamar o resultado, eu peço o adiamento. Eu como relator indico o adiamento e reexamino tudo mais uma vez”, concluiu o ministro Joaquim Barbosa.
Voto de Desempate
A análise do inquérito do MPF contra o senador Valdir Raupp foi retomado na manhã desta sexta-feira (18) com a apresentação do voto de desempate do ministro Celso de Mello, pelo recebimento da denúncia e a abertura da ação penal contra o parlamentar e ex-governador de Rondônia.
Para o ministro Celso de Mello, há no caso a demonstração de elementos probatórios mínimos e lícitos sobre a possível autoria dos crimes e a formulação de justa causa para o recebimento da denúncia, ao afirmar que “a denúncia em questão não se limitou a atribuir autoria coletiva dos acusados por suposta prática de crime contra o sistema financeiro”.
Após a fundamentação de seu voto o ministro Celso de Mello concluiu: “por entender admissível a acusação penal formulada contra todos os denunciados, respeitosamente peço venia, não obstante reconhecendo o alto relevo das objeções aqui suscitadas, para receber integralmente a presente denúncia”.
Leia a íntegra do voto do ministro Celso de Mello no Inquérito 2027.
Entenda o caso
O caso começou a ser julgado há quase 3 anos, em 26 de abril de 2007, quando o relator, ministro Joaquim Barbosa, havia votado pelo recebimento da denúncia – e pela consequente instauração de ação penal contra o ex-governador. Desde então, houve dois pedidos de vista, o primeiro feito pelo ministro Gilmar Mendes e o segundo pelo ministro Menezes Direito, falecido em 1º de setembro de 2009.
Na tarde de ontem, 17 de dezembro de 2009, o julgamento foi iniciado para a apresentação do voto do ministro Dias Toffoli, que sucedeu o ministro Menezes Direito, que não chegou a proferir voto no processo. O ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência iniciada pelo ministro Gilmar Mendes pela rejeição da denúncia.
Segundo ele, os autos não demonstram indícios concretos de autoria, uma vez que Raupp não teria conhecimento do deslocamento da verba. Os ministros Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e Cezar Peluso votaram no mesmo sentido. Gracie ressaltou que Raupp nunca deu ordem para efetivar a transação, portanto não houve indícios de autoria.
O ministro Ricardo Lewandowski decidiu reformular o voto, no sentido de rejeitar totalmente a denúncia, isto é, em relação a todos os envolvidos, por entender que os objetivos do convênio foram cumpridos dentro do prazo. Segundo ele, informações contidas na internet apontaram documento da União revelando que, de acordo com auditoria feita no próprio governo federal, o valor retornou e o convênio teve cumprida a sua finalidade.
“A situação do convênio é de adimplência”, afirmou o ministro. Isto porque, conforme o governo federal, a verba, desviada anteriormente para o próprio Tesouro Nacional, teria retornado à origem. Lewandowski ressaltou que a denúncia foi feita em 4 de novembro de 2002 e o cumprimento do convênio realizado em 22 de agosto de 2003.
Abertura da ação penal
Contudo, o ministro Joaquim Barbosa (relator) permaneceu com o seu voto. “Os documentos não chegaram as minhas mãos em seis anos. Foram produzidos unilateralmente, além de não terem sido submetidos ao contraditório em momento próprio”, disse.
Para o ministro Marco Aurélio, é fato incontroverso que, no caso, houve desvio de finalidade. “O fato de a quantia ter voltado confirma o ato anterior”, disse, ao completar que nessa primeira fase é necessário o simples indício de autoria. Ele destacou que o fato de Raupp não saber do deslocamento dos recursos para setor diverso implica dizer que “a governança era exercida com autonomia pelos secretários de Estado”. Os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Cármen Lúcia, Eros Grau e Carlos Ayres Britto votaram, acompanhando Joaquim Barbosa, pela abertura da ação penal.
AR/EC/LF
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