Pedido de vista da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha suspendeu o julgamento, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), do Habeas Corpus (HC) 87395. No HC, a defesa pede o trancamento da ação penal que tramita perante o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) contra Mário Sérgio Bradock Zacheski - deputado estadual do Paraná -, Amarildo Gomes da Silva, Obadias de Souza Lima e Sênio Abdon Dias.
Os três primeiros acusados foram denunciados pela prática de homicídio e tentativa de homicídio qualificados, ambos em concurso de pessoas; de fraude processual qualificada; e dos ilícitos previstos no artigo 10, caput, e parágrafo 4º da Lei 9437/97 (posse, guarda, porte de arma de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal). Já Sênio Abdon Dias é acusado de ter praticado, por três vezes, falsidade ideológica em concurso de pessoas. Ele seria responsável, como delegado de polícia presidente do inquérito, pela manipulação de testemunhas e inclusão de informações falsas nos termos de declaração.
Eles contestam decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que manteve o recebimento da denúncia pelo Órgão Especial do TJ-PR, bem como o desmembramento dos autos, exclusivamente contra o parlamentar, em virtude de prerrogativa de foro.
No habeas, a defesa discute a possibilidade do desarquivamento de inquérito policial e posterior oferecimento de denúncia, tendo em vista que o arquivamento ocorreu pelo reconhecimento de legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal, excludentes de ilicitude contidas no artigo 23, do Código Penal (CP). Outro motivo para o arquivamento estaria no artigo 18, do Código de Processo Penal (CPP), segundo o qual, “a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia”.
O caso
O Ministério Público contou que o delito ocorreu no exercício das funções dos policiais, “que pretendiam a prisão do foragido Osni”. De acordo com o MP, “a reação ilegal da gangue de Osni, da qual a vítima Joel Ribeiro fazia parte e encontrava-se também atacando injustificadamente a ação legal da polícia, fez com que houvesse reação por parte dos policiais que estavam cumprindo com seu dever legal e também, ao revidarem o ataque, faziam sentido de defender-se”.
A partir desse fato, o Ministério Público, com base no artigo 18, pediu o arquivamento do inquérito e, somente depois, demonstrou que declarações das testemunhas teriam sido alteradas ou manipuladas pela autoridade policial.
Tese da defesa
Em síntese, os impetrantes sustentam que estão sofrendo constrangimento ilegal, “porquanto o arquivamento do inquérito policial, a pedido do Parquet [MP], produz coisa julgada material, o que torna inviável o desarquivamento do inquérito e a posterior instauração de ação penal, nos termos do artigo 18, do Código de Processo Penal”.
Aduzem que “a questão relevante não é se o arquivamento foi por atipicidade ou pelo reconhecimento da presença de excludentes de antijuridicidade”, uma vez que, no caso concreto, houve “recusa de promover a ação” por parte do Ministério Público.
Dizem, ainda, que o fato somente passou a constituir crime no instante em que o paciente, Mário Sérgio Bradock Zacheski, elegeu-se deputado estadual pelo PMDB do Paraná, sendo estranho que, no momento em que ele estava sendo cogitado para ocupar a pasta da Secretaria de Segurança do estado, o Ministério Público procedeu uma “reinvestigação que consumiu apenas poucos dias”, após os quais a denúncia foi encaminhada ao Tribunal de Justiça.
Voto do relator
Responsável pela relatoria do HC, o ministro Ricardo Lewandowski ressaltou no início do voto ser possível que a excludente de ilicitude não tenha ocorrido e que eventual fraude na condução do inquérito tivesse induzido o Ministério Público a pedir o seu arquivamento. No entanto, o ministro analisou que, “em face dos novos elementos de convicção colhidos pelo Parquet [MP] mostra-se admissível a reabertura das investigações nos termos do artigo 18, do CPP”.
Conforme o relator, a juíza de primeiro grau autorizou a reabertura do inquérito remetendo os autos à Procuradoria Geral de Justiça. “Visto que um dos investigados era parlamentar estadual, implicitamente determinou a devolução dos autos à autoridade policial para proceder a novas pesquisas, como estabelece a parte final do dispositivo da Lei Processual Penal [artigo 18]”, afirmou Lewandowski.
Para o ministro, competia ao Ministério Público, a partir dos dados complementares que obteve, requisitar novas diligências à autoridade policial nos termos do artigo 13, II, do CPP. “Me parece que os autos teriam que voltar para a polícia”, disse o relator.
“Não poderia, portanto, o Ministério Público ter simplesmente oferecido nova denúncia, com base em investigações feitas de forma independente da polícia, realizando verdadeira ‘contra-prova’ para opô-la ao acervo probatório colhido no âmbito policial”, ressaltou o ministro Ricardo Lewandowski.
Assim, o relator conheceu do habeas corpus, deferindo-o em parte, apenas para anular o recebimento da denúncia, “que poderá ser repetida, se for o caso, depois da realização de novas investigações, por meio do competente inquérito policial, no prazo previsto em lei”.
Após amplo debate realizado pelos ministros que compõem a Primeira Turma, eles destacaram a importância do caso. “Essa é uma questão complexa porque, a meu ver, ela envolve a indagação do poder do Ministério Público de produzir elementos de informação independentes do inquérito policial”, avaliou o ministro Sepúlveda Pertence. Em seguida, a ministra Cármen Lúcia pediu vista dos autos.
EC/RB
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